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terça-feira, novembro 15, 2011

Beatriz

-Não entendo. Porque iremos embora mamãe?
Sônia olhou aqueles olhos tristes pensando no que dizer para justificar os últimos acontecimentos na vida da filha, mas, a pequena não tinha mais que oito anos. Era jovem demais para entender o mundo complicado dos adultos.
Então, levantando suavemente o rosto de Beatriz em sua direção, sorriu, dando inicio a uma nova explicação:
-Ah meu amor, nós iremos para outra cidade conhecer novas pessoas, ter uma nova casa... 
Você não quer fazer novos amiguinhos?
Aqueles olhos duvidosos pareciam não acreditar no que lhe era dito, sempre desconfiados.
-Gosto dos meus amigos e da nossa casa. Não precisamos de coisas novas.
-Bem querida isso não é uma escolha.  Pense que você fará novos amigos, terá uma nova escola. Tudo novo!
-E porque deixaremos o papai, quem vai cozinhar e deixar tudo limpinho? Questionou.
-Não se preocupe querida – Sônia respondeu em tom amargurado- 
o papai tem uma nova amiga que vai ajuda-lo.
  

E foi assim que a primeira mulher da minha vida apareceu. 
Ela perdeu a graciosidade com os anos. No geral, parecia uma criança grande que enxergava duendes em todo o canto. Beatriz e eu crescemos juntos. Ela tornou-se mais que amiga, ela era uma irmã. Falávamos sobre tudo: mulheres, homens, filmes, sonhos e objetivos. Bons tempos. Naquela época eu conseguia sonhar.


Alguns anos se passaram... Beatriz fez novos amigos, mas, não gostou da nova casa.
Ela cresceu e aos quatorze anos já sabia o suficiente sobre a traição do pai e que sua nova amiga fazia muito além de cozinhar e limpar a casa: ela fazia o serviço completo cama, mesa e banho. Isso a abalava mais quando estava próximo a algum feriado. Apesar de tudo, era seu pai. 
Talvez isso a envergonhasse mais do que a decepcionasse.
É a única coisa que até hoje não conseguir definir vergonha ou decepção.
Beatriz era transparente e quando pensava nisso, profundamente, seu rosto se contorcia como se fosse vomitar a qualquer instante. E ainda sim, sorria.
O que lhe faltava em beleza era compensado em carisma. Ela possuía olhos escuros e profundos que brilhavam a cada sorriso, o que facilmente fazia lembrar o mar durante a noite. Seu sorriso gigantesco era o convite para um bom dia. Nunca a vi chorar, mas, se isso acontecesse eu estaria ali para ela.
Sempre.




"Ela compartilhava comigo sua ingenuidade e eu cuidava para que isso nunca terminasse."

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